Há, aparentemente, um boom de literatura africana no mundo. Escritores africanos ou de ascendência africana mais ou menos recente, residentes ou não em África, têm publicado cada vez mais e conquistado alguns dos prémios literários internacionais mais importantes, como, no ano passado, o Prémio Nobel de Literatura. Não incluo aqui, óbvio, os afroamericanos (estadunidenses, caribenhos e latino-americanos) descendentes dos homens escravizados que foram levados para as américas há séculos.

Por razões que têm a ver com a actual situação económico-social das nações africanas, afectando directamente o mercado literário, a maioria desses autores mora ou passa grandes temporadas no estrangeiro, com destaque para a Europa e os EUA. Costumam, por isso, ser considerados autores da diáspora africana. Como é que esta tendência ou fenómeno se manifesta em Angola?
Há na história literária angolana, diga-se, numerosos casos de autores diaspóricos, pelo menos em certos momentos da respectiva existência. Desde logo, o autor do primeiro livro conhecido da literatura angolana, Espontaneidades da minha alma (1849), José da Silva Maia Ferreira, viveu largas temporadas da sua vida no estrangeiro (Portugal, Estados Unidos e Brasil, onde acabou por falecer, em 1867).
Outros autores conhecidos emigraram para Portugal no século 20, antes da independência de Angola. A título de exemplo, recordo o caso de Mário António, um dos grandes nomes do Movimento Vamos Descobrir Angola, que deu origem à moderna literatura angolana, cujos vínculos com o nacionalismo político costumam ser assinalados quer pelos críticos literários quer pelos historiadores. Tendo-se distanciado politicamente dos seus pares, Mário António acabaria desprezado por eles, mas o valor da sua obra literária jamais deixou de ser enaltecido.
Após a independência de Angola, em 1975, muitos autores emigraram do país, por força da situação de guerra, dos conflitos políticos internos e da crise económica e social. Os mesmos podem ser agrupados de acordo com factores e circunstâncias peculiares.
Assim, num primeiro momento, deixaram o país autores de origem portuguesa, alguns já nascidos em Angola, entre eles nomes importantes e cuja contribuição para a história da literatura angolana é indiscutível, como Leonel Cosme. Autores ligados aos movimentos políticos derrotados nos confrontos que antecederam a proclamação da independência nacional, incluindo dissidências do MPLA, a organização que tomou o poder na época, também foram parar à diáspora. São os casos, entre outros, de Zetho Gonçalves e Manuel dos Santos Lima. Pode também ser mencionado o exemplo de Sousa Jamba, cujo primeiro livro – Os Patriotmas – foi publicado em inglês no Reino Unido.
A partir do final dos anos 80, autores jovens, surgidos entre o final do período colonial e os primeiros anos da independência, como Rui Bueti, Jorge Monteiro dos Santos, Fernando Monteiro e outros, também emigraram, principalmente para Portugal. O paradeiro exacto desses autores é desconhecido, ignorando-se, também, se os mesmos continuam a produzir. Isso pode ser um bom tema de pesquisa pelos académicos e críticos literários.
Em 1992, três anos depois da queda do Muro de Berlim e quando a aventura socialista acabou igualmente em Angola, aquele que é considerado o grande nome da ficção angolana, Luandino Vieira, e que, além de escritor, foi um empenhado militante nacionalista e revolucionário, tendo estado 14 anos preso pela polícia política portuguesa, decidiu também deixar o país, vivendo hoje semi-isolado numa aldeia do norte de Portugal.
Dois outros autores angolanos conhecidos – José Eduardo Agualusa e Ana Paula Tavares – vivem hoje no estrangeiro, por decisão pessoal, o primeiro em Moçambique (já viveu em Portugal e no Brasil) e a segunda, em Portugal. Agualusa saiu de Angola aos 14 anos de idade, com os pais, na véspera da independência, tendo voltado a morar no país por um breve lapso de tempo, já adulto, enquanto Ana Paula Tavares emigrou para Portugal mais recentemente.
Mais jovens do que Ana Paula Tavares e Agualusa, mencionarei ainda outros nomes de autores angolanos que vivem ou já viveram na diáspora. Por ordem de publicação, começo por Ondjaki, que viveu em Portugal, Itália e Brasil, tendo regressado recentemente a Luanda, onde criou uma editora e abriu uma livraria. Além dele, cito mais três, que permanecem fora de Angola: Kalaf Epalanga (Alemanha), Yara Monteiro (Portugal) e Djaimilia Pereira de Almeida (Portugal).
Menciono, por fim, um sem número de autores angolanos, a maioria talvez desconhecida, que vive em trânsito entre Angola e o estrangeiro, passando períodos de tempo num e no outro lado, em estudo, trabalho ou outras razões. É o caso do jovem escritor Benjamim Mbakassy, vencedor da penúltima edição do Prémio Literário DST Angola/Camões, ou da poeta Tchiangue Cruz.
A conclusão a tirar, observando essa vasta lista de nomes e pensando, igualmente, nos que ficaram por mencionar, é que a diáspora literária angolana é profundamente diversificada, quer em termos de “raça” quer em termos de circunstâncias, razões e motivações. O facto – diga-se – não apenas reflecte cabalmente a composição demográfica dos angolanos, nem sempre conhecida ou entendida no exterior, como resulta também da história do país.